Enem tem questões sobre racismo, ditadura, Simone Biles e Israel; veja temas
O primeiro dia de provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2023, realizado neste domingo (5/11), em todo o Brasil, teve questões que abordaram desde o racismo em diferentes contextos ao desmatamento na Amazônia. Os estudantes também tiveram de responder a itens sobre o que antecedeu a criação do Estado de Israel, ditadura militar, igualdade de gênero, a ginasta Simone Biles e protestos de torcedores do Fluminense contra cantos preconceituosos em estádios.
Neste domingo, além das provas de Linguagens e Ciências Humanas, com 45 questões cada, também foi aplicada a redação do Enem, que teve como tema os “Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil”.
Os exames começaram a ser aplicados às 13h30 e o horário limite para conclusão é às 19h. A segunda parte do Enem, com questões de Ciências da Natureza e Matemática, acontece no próximo domingo. Na avaliação de professores de cursinho, o exame apresentou nível equilibrado, com questões carregadas de textos interpretativos e, por vezes, extensos. “Foi uma prova com temas bem progressistas, que abordavam principalmente temas de engajamento social”, afirma Caê Lavor, diretor de Avaliações no SAS Educação. “Vários temas associados à equidade de gênero serviram como contexto na prova.”
Segundo ele, um destaque na edição deste ano foi que vários enunciados usaram referências consideradas atuais. “Isso tornou a linguagem de alguns enunciados muito mais acessível, permitindo esse aluno se conectar com a informação. Porém, isso exigiu do aluno habilidades diferentes. Ele precisou ter muito mais senso crítico e muito mais consciência social”, diz o professor.
Um dos destaques da prova foi uma questão que abordou os problemas de saúde mental externados pela ginasta Simone Biles, que recentemente foi destaque no Campeonato Mundial de Ginástica Artística após passar dois anos sem competir. Houve também uma questão que abordou Torto Arado, livro do escritor Itamar Vieira Jr. sucesso de vendas no ano passado. Além de itens com menção às escritoras Conceição Evaristo, autora do livro Olhos D’Água, e Jarid Arraes, autora de Corpo Desfeito. “A prova trabalhou pontos como violência de gênero e violência racial, além de trabalhar todas as questões que envolvem as invisibilidades de vários grupos identitários”, diz Natanael Soares de Barros, coordenador pedagógico do Poliedro. Ele cita que uma das questões, por exemplo, aborda o reconhecimento do trabalho da arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi, que projetou o Museu de Arte de São Paulo (Masp).
Outra questão abordou o protesto realizado por torcedores do Fluminense, clube que foi campeão da Libertadores da América neste sábado, 4, contra cantos preconceituosos direcionados a outras torcidas. “Na própria reflexão que o enunciado faz, existe uma conotação de tradição elitista para poder xingar, chamar, ofender as pessoas em situação de escravidão. Por outro lado, existe um destaque para esse grupo do Fluminense que, enxergando a conotação preconceituosa, quer descaracterizar isso”, diz Barros.
Um dos textos, além disso, abordou a Declaração de Balfour, carta de 1917 em que britânicos se comprometeram a criar um território para Israel e que pode ser considerada como um marco que antecedeu a criação do Estado israelense. O tema está em alta por conta da Guerra Israel-Hamas, mas, segundo professores de cursinho, foi tratado de forma objetiva. “É um documento importante no processo que vai levar à construção do Estado de Israel na região da Palestina. A prova do Enem não é uma prova que costuma cobrar temas que estão em alta, mas desta vez cobrou”, afirma João Jacomelli, professor de História do Colégio Curso AZ, que também destacou o retorno do tema da ditadura militar. “Foram muitas questões de interpretação de texto e interdisciplinares, e poucas questões conteudistas.” Sobre o regime militar, foram duas questões presentes na prova de Ciências Humanas, segundo professores de cursinho. Uma primeira relacionada ao processo de sindicalização rural e outra que abordava instrumentos de repressão presentes no período. Especialistas avaliaram como positivo o retorno do tema ao maior exame do País.
Houve também espaço para questões relacionadas à Amazônia. “A prova contou com muitas perguntas sobre questões ambientais, mudança climática e desmatamento da Amazônia”, diz Althieres Lima, professor de Geografia da Escola SEB Lafaiete. “Das questões que já esperávamos, teve uma sobre, fome pois o Brasil apareceu no mapa da fome o ano passado (…) Destaco ainda uma questão sobre a aproximação entre Mercosul e União Europeia, a gente já esperava alguma coisa sobre isso.”
O Enem está sendo feito apenas presencialmente neste ano. Em março, o Ministério da Educação decidiu acabar com o formato digital do Enem, criado pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) em 2020 em meio à pandemia. Segundo o MEC, poucos estudantes optaram nos últimos anos pela avaliação feita pelo computador, que tem alto custo.
Em São Paulo, o primeiro dia de aplicação da prova está marcado pelos impactos do temporal e da falta de energia em parte do Estado e problemas na alocação de participantes longe de casa. Parte dos candidatos acordou cedo para cruzar a cidade até o local de prova, com relatos de deslocamentos de até mais de 1h30 na capital paulista. Mais de 3,9 milhões de candidatos participam neste domingo do Enem. O Enem está sendo aplicado em 132 mil salas de aulas de 1.750 municípios de todo o País. No próximo dia 12, os participantes fazem as avaliações de Ciências da Natureza (45 questões) e Matemática (45 questões). A aplicação terá 5 horas de duração, contadas a partir da autorização do chefe de sala para o início das provas.