Cidades

“Brasil pode perder o Cerrado em sua totalidade”, diz especialista da ONU

“Dados mostram que restam apenas 35% de área nativa do Cerrado no Brasil. É um bioma que está sendo desmatado na maior velocidade, onde corremos o risco de perdê-lo em sua totalidade”. A afirmação é do gerente sênior de Meio Ambiente no Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU) no Brasil, Alexander Rose. A declaração foi dada durante evento que trata da agenda 2030, principalmente o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) de número 6 –  Água potável e Saneamento básico, realizado no Centro Cultural Oscar Niemeyer, em Goiânia, nesta segunda-feira (5/6), data que celebra o Dia Mundial do Meio Ambiente.

Os alertas de desmatamento no Cerrado cresceram 31% em abril deste ano, em relação ao mesmo período do ano passado, passando de 541 quilômetros quadrados para 709. Essa área é cerca de duas vezes maior do que o desmate registrado na Amazônia Legal, conforme dados do Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia.
Comparando o mesmo período de 2022, nos primeiros quatro meses deste ano a devastação no Cerrado teve aumento de 17%. A porcentagem corresponde a uma área de 2.133 quilômetros quadrados. O acumulado é 48% maior que a média histórica para o bioma.

Conforme dados da plataforma SAD, desenvolvida pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), 27 milhões de hectares foram perdidos nas últimas quatro décadas, sendo as atividades agropecuárias as principais agentes da devastação do Cerrado.


Gerente sênior de Meio Ambiente no Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU) no Brasil, Alexander Rose

Para Alexander, uma das formas mais eficazes de combate ao desmatamento é unir empresas a ações coletivas para ter direções sobre boas práticas ambientais, principalmente no que diz respeito a áreas de produção do agronegócio. “Em Goiás e no Amazonas, por exemplo, há muita pecuária extensiva, onde pode-se produzir mais em menos área. No meu ponto de vista, não precisamos mais expandir”, pontuou.

Desmatamento do Cerrado e crise hídrica no Brasil 

O desmatamento do Cerrado na região conhecida como Matopiba – que engloba Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia – pode reduzir o abastecimento e a qualidade da água em ao menos 373 municípios, se seguir o ritmo atual. Somente em Goiás, são 119 municípios que estão dentro da área das bacias hidrográficas mais desmatadas do bioma em 2022, na região da fronteira agrícola. Segundo o Sistema de Alerta de Desmatamento do Cerrado (SAD Cerrado), 74,5% de todo o desmatamento do bioma no ano passado ocorreu nas bacias dos rios Tocantins (210.804 hectares), São Francisco (116.367 ha), Parnaíba (105.419 ha), Itapecuru (88.049 ha) e Araguaia (78.368 ha).
Além de Goiás, entre os estados do Cerrado brasileiro com maior número de municípios com ocorrências de desmatamento estão Tocantins (108), Maranhão (65), Minas Gerais (32), Piauí (22), Mato Grosso (15) e Bahia (12). Em Goiás, alguns dos municípios com maiores índices de destruição do bioma até agora foram Araguapaz, Arenópolis, Aruanã, Bom Jardim de Goiás, Colinas do Sul, Crixás, Fazenda Nova, Goianésia, Goiás, Jussara, Niquelândia e Santa Rita do Araguaia.

Os dados expõem a relação entre desmatamento e segurança hídrica no bioma considerado berço das águas do Brasil. Pauta também discutida no evento Pacto Global da ONU, que foi realizado em Goiânia na tarde desta segunda (5). Além do tema, a universalização do saneamento entrou na discussão.

Com o objetivo de buscar ampliar práticas sustentáveis, a Companhia de Saneamento de Goiás (Saneago) estipulou três metas do Movimento + Água: a universalização do saneamento até 2033, como 99% das pessoas com acesso à água potável e 90% de esgoto coletado e tratado, além do reflorestamento de 50% das áreas críticas, que auxiliam na produção natural de água.


Presidente da Saneago, Ricardo Soavinski

Presidente da Saneago, Ricardo Soavinski ressalta que o Estado como um todo precisa trabalhar bem para gerar impactos positivos ao meio ambiente, com ações desde a preservação, ordenamento do uso da água e a distribuição. “Goiás tem um índice com menor perda de água no País, sendo Goiânia entre as principais capitais do mundo com bons números no que se trata a preservação de água”, descreveu.

Políticas públicas eficientes
De acordo a professora doutora e coordenadora do Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (Lapig) (IESA/UFG), Elaine Barbosa da Silva, Goiás tem dado bons exemplos de ampliação da fiscalização do desmatamento ilegal. A tendência é de intensificar as ações de fiscalização conjuntamente com ampliação de ações que ajudem na preservação e, com isso, ter expectativa de redução dos desmatamentos.

No entanto, segundo a coordenadora, apesar do Brasil ter boas leis, as punições reais em todos os biomas devem ser intensificadas. “Não temos mais necessidade de derrubar uma árvore para ampliar e melhorar a produção agropecuária. Temos áreas suficientes tanto para expansão da produção quanto para recuperação”, exemplifica em entrevista ao jornal A Redação.

Outra necessidade, de acordo com ela, é a ampliação da educação ambiental em todas as instâncias da sociedade para que cada pessoa assuma a sua responsabilidade e, assim, promover o consumo dos recursos naturais de forma sustentável. “Embora eu trabalhe e veja a dura realidade pelos dados de desmatamento e de uso e cobertura das terras, eu tenho esperança de dias melhores com a pressão social para que as empresas invistam, de fato, na sustentabilidade”, pontua.

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